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Espondilólise e Espondilolistese

INTRODUÇÃO

 As palavras espondilólise (spondylos: vértebra; lysis: falha, defeito ou fissura) e espondilolistese (spondylos: vértebra; olisthanein: deslizamento) originam-se do grego.
A espondilólise é caracterizada pela presença de um defeito ou falha na pars interarticular da vértebra (Fig Espondilólise). A espondilolistese é o deslizamento anterior de uma vértebra sobre outra, podendo ser conseqüência da espondilólise (Fig Espondilolistese).
 
A área da coluna vertebral mais acometida é a transição lombossacra, seguida pela coluna lombar média, pela coluna cervical, e, raramente, pela coluna torácica.
 
ETIOLOGIA E CLASSIFICAÇÃO
 
A classificação de Wiltse é a mais utilizada e baseia-se em fatores etiológicos e anatômicos (Tabela).


Tabela. Classificação de Wiltse das espondilólises e espondilolisteses

 

 
 
I – Congênita
 
A.      Displasia dos processos articulares e de outros elementos do arco vertebral, freqüentemente associado a espina bifida.
B.       Displasia dos processos articulares com orientação sagital das facetas articulares resultando em instabilidade, primariamente em L5-S1.
C.       Presença de outras anormalidades que produzem deslizamento como, por exemplo, a cifose congênita.
     
 
II – Ístmica
A.      Lítica, fratura de stress da pars interarticular.
B.       Alongada, pars interarticular alongada, resultado da consolidação da fratura de stress do tipo II A.
 
 
III – Degenerativa
 
IV – Pós-traumática: Resultado de um evento traumático produzindo deslizamento vertebral. A lesão ou o defeito da vértebra localiza-se em área diferente da pars interarticular.
 
V – Patológica: Deslizamento resultante de uma doença do osso localizada ou generalizada.
 
VI – Pós-cirúrgica: Resultado da perda total ou parcial de elementos do arco vertebral que contribuem para a estabilidade.
 

 
 
Espondilolistese congênita
 
Tipo I A. É causada pela falha de formação de estruturas do arco vertebral. A displasia dos processos articulares não impede o deslizamento da vértebra superior e a pars interarticular pode estar íntegra, alongada ou descontínua. Se a pars interarticular for íntegra, em geral, o desvio não ultrapassa 35% de deslizamento. Se o deslizamento excede esse valor, pode ocorre a síndrome da cauda eqüina. A espina bifida oculta é muito freqüente nesse tipo.
Tipo I B. É causada principalmente pela orientação sagital das facetas articulares. O risco de dor é maior neste tipo se comparado ao tipo I A.
Tipo I C. Causada por outras anormalidades da coluna capazes de gerar instabilidade e deslizamento entre duas vértebras. Este tipo pode ocorrer em qualquer segmento da coluna vertebral e está mais freqüentemente associado ao déficit neurológico.


Espondilolistese ístmica

A espondilolistese ístmica decorre de um defeito na pars interarticular. Diversos estudos apóiam a teoria das causas genética e traumática para esse defeito, cuja incidência é maior em familiares e parentes de pacientes com espondilólise ou espondilolistese (15%) que na população geral (6%). A mais alta incidência conhecida ocorre em certas tribos de esquimós (54%). Homens brancos são mais afetados que mulheres negras, com incidência de 6,4% e 1,1%, respectivamente. A importância do traumatismo na gênese do defeito é sugerida pela maior incidência da doença em pessoas submetidas ao maior esforço da coluna. Atletas submetidos ao trauma repetitivo da coluna lombossacra, como ginastas, remadores, saltadores, wrestlers e mesmo jogadores de vôlei, basquete ou futebol, apresentam alta incidência de espondilólise ou espondilolistese. Rosemberg e colaboradores não encontraram a doença em uma larga série de pacientes que nunca deambularam. O defeito parece ser resultado do traumatismo repetitivo na pars interarticular exercido pelo processo articular inferior da vértebra acima dela e do processo articular superior da vértebra abaixo, como num mecanismo de turquesa durante a extensão da coluna lombossacra.
Em síntese, a etiologia da espondilólise e da espondilolistese ístmica parece ser resultado de uma predisposição genética da pars interarticular ao defeito associado ao traumatismo crônico e repetitivo. A espondilolistese ístmica é dividida em tipos II A e II B. 
 
Tipo II A. Neste tipo o defeito é bem visualizado, havendo uma solução de continuidade clara na pars interarticular, caracterizando a fratura de stress.
Tipo II B. A pars interarticular está alongada. Presume-se que seja resultado da consolidação da fratura de stress vista no tipo II A.
 
Espondilolistese degenerativa
 
A espondilolistese degenerativa parece ser resultado da instabilidade segmentar vertebral decorrente do processo degenerativo. Inicialmente, ocorre a degeneração discal, seguida de uma sobrecarga nas facetas articulares, resultando em degeneração e mudança na orientação das facetas (mais sagitais), hipermobilidade e subluxação facetária.
 
A freqüência da espondilolistese degenerativa é maior em mulheres, especialmente se já submetidas a ooforectomia ou diabéticas. Observa-se também uma maior incidência quando a quinta vértebra lombar (L5) é parcial ou totalmente sacralizada.
 
Espondilolistese pós-traumática
 
É causada por traumatismo agudo e, em geral, de alta energia. A lesão vertebral que permite a listese vertebral ocorre em um local diferente da pars interarticular. As fraturas dos processos articulares ou dos pedículos são exemplos que podem permitir o deslizamento, que, nesse caso, é a própria fratura-luxação.
 
Espondilolistese patológica
 
Doenças generalizadas ou localizadas do osso podem permitir a listese. Osteoporose, osteopetrose e sífilis são exemplos de doenças generalizadas que enfraquecem globalmente as estruturas que dão estabilidade vertebral. Doenças localizadas, como infecções ou neoplasias, podem enfraquecer essas estruturas em um ou mais níveis da coluna vertebral e, da mesma forma, permitir a espondilolistese.
 
Espondilolistese pós-cirúrgica
 
É causada pela instabilidade decorrente de um procedimento cirúrgico. Isoladamente, a laminectomia é o procedimento cirúrgico que mais causa instabilidade. Se o procedimento resulta em remoção de mais de 50 % da superfície articular facetária, a espondilolistese é muito provável e, nesse caso, recomenda-se a fusão imediata, juntamente com a laminectomia.

HISTÓRIA NATURAL
 
O conhecimento da história natural de uma doença é fundamental para o estabelecimento do prognóstico e do tratamento. Neste capítulo, serão descritos os aspectos mais importantes da história natural dos tipos displásico, ístmico e degenerativo. Os outros tipos são dependentes do fator causal específico e fogem aos objetivos deste livro.
 
Congênita ou displásica. Afeta principalmente o sexo feminino na razão feminino/masculino de 2:1. A probabilidade de progressão é relativamente grande neste tipo e ocorre mais freqüentemente no período do estirão puberal. Em geral, o arco posterior está íntegro podendo, ocorrer compressão da primeira raiz nervosa sacral (S1) ou a síndrome da cauda eqüina se o deslizamento é muito grande ou abrupto. Deslizamento súbito pode ocorrer durante o estirão puberal ou seguindo-se a um episódio traumático, manifestando-se mais freqüentemente como lombalgia aguda. Ocasionalmente, fusão espontânea intervertebral pode ocorrer no nível da instabilidade, impedindo o deslizamento adicional.
 
Ístmica. A história natural deste tipo é a mais bem conhecida. Um excelente estudo prospectivo com 500 indivíduos em idade escolar, entre cinco e seis anos, selecionados aleatoriamente e acompanhados durante 25 anos, foi realizado por Fredrickson e colaboradores. A partir deste e de outros estudos, vários aspectos da história natural da espondilolistese ístmica foram estabelecidos. A incidência da espondilólise com ou sem espondilolistese na população geral é de 4,4% aos seis anos de idade, 6,0% no adulto e inexistente ao nascimento. É mais freqüente em esquimós, na raça branca, em praticantes de esportes com sobrecarga em extensão da coluna lombossacra e no sexo masculino, na razão masculino/feminino de 2:1. Até o momento, a lesão foi encontrada somente na espécie humana, não sendo observada em pacientes que nunca deambularam. A freqüência da espina bifida em pessoas com espondilólise ou espondilolistese pode ser até 13 vezes maior que na população geral. A grande maioria dos portadores da lesão não apresenta sintomas ou limitação funcional. A incidência de lombalgia é a mesma da população normal em pacientes com até 10% de deslizamento, e os sintomas, quando presentes, são, em geral, brandos e não ocasionam limitação das atividades funcionais. A idade entre 10 e 15 anos é a de maior risco para a progressão da doença. Na idade adulta, a progressão raramente ocorre.
Os principais fatores de risco associados com a progressão são mostrados na Tabela.
 
Tabela. Fatores de risco para a progressão das espondilolisteses congênitas e ístmicas
 

 
I – CLÍNICOS
 
A.      Idade: Crianças menores de 10 anos.
B.       Sexo: Feminino.
C.       Sintomatologia. Crianças com dor lombar.
D.      Hiperelasticidade ligamentar
 
II – RADIOLÓGICOS
A.      Tipo de espondilolistese: O tipo displásico tem maior probabilidade de progressão que o tipo ístmico.
B.       Grau de deslizamento: Quanto maior o grau de deslizamento, maior a probabilidade de progressão. Acima de 50% é quase certa a progressão.
C.       Grau de rotação ou cifose lombossacra: Se maior que 40º.
D.      Grau de mobilidade L5-S1: Quanto maior a mobilidade, maior o grau de instabilidade e maior a probabilidade de progressão. É determinada pelo exame dinâmico com radiografias em flexão e extensão.
E.       Instabilidade anatômica: A vértebra com formato trapezoidal e a superfície superior e anterior do sacro arredondada são sinais de instabilidade e é maior a probabilidade de progressão. Osteófito ântero-superior do sacro e estreitamento do espaço discal são sinais de estabilidade e é menor a chance de progressão.
 

 
Degenerativa. Este tipo de espondilolistese é resultado da instabilidade segmentar secundária às alterações degenerativas que ocorrem em um nível vertebral. Em geral, surge após os 40 anos de idade, e a incidência no sexo feminino é maior que no masculino. A incidência média aos 79 anos de idade é de 12% nos homens e 25% nas mulheres. Mulheres negras são três vezes mais afetadas que as brancas. O nível L4-L5 é até 10 vezes mais acometido que os níveis adjacentes. Neste tipo, o deslizamento raramente ultrapassa um terço do comprimento vertebral. A presença de vértebra de transição é quatro vezes mais freqüente que na população geral, e o diabetes tem sido apontado como fator de risco para o deslizamento vertebral.
Dois terços dos indivíduos com espondilolistese degenerativa não apresentam sintomas ou incapacidade funcional. Dentre os sintomáticos, a minoria tem seus sintomas agravados com o tempo. No estudo prospectivo de 25 anos de acompanhamento de Framingham, Kauppila e colaboradores não se observaram o desenvolvimento de paraplegia ou limitação funcional grave.
 
QUADRO CLÍNICO
 
Crianças e adolescentes
 
A espondilólise e a espondilolistese podem ser assintomáticas. É comum que o problema seja diagnosticado acidentalmente, durante um exame radiológico realizado por outras razões. Na criança com idade inferior a 10 anos, a doença raramente causa algum sintoma além de uma aparente má-postura ou um aumento da lordose. As queixas geralmente iniciam-se na pré-adolescência ou adolescência. O principal sintoma é a dor lombar, que pode ou não se irradiar para as nádegas ou para a face posterior das coxas. Caracteristicamente é uma dor do tipo mecânica, surgida após algum excesso de atividade física envolvendo flexão e extensão da coluna vertebral e aliviada com o repouso ou a restrição das atividades. Dor radicular resultante da compressão de uma raiz nervosa é relativamente rara na criança ou no adolescente. Uma marcha característica pode ser observada em pacientes com grave espasmo dos músculos isquiotibiais. O encurtamento dos isquiotibiais inclina a pelve posteriormente e impede a completa flexão do quadril para a marcha normal. Conseqüentemente, o paciente tem uma marcha rígida, com pequena amplitude do passo, sendo a pelve rodada a cada passo. Essa marcha é conhecida como marcha do gingado do pato. A criança ou o adolescente pode preferir correr a andar, ou andar sobre a ponta dos dedos, com os joelhos ligeiramente flexionados.
No exame físico, além da marcha característica, podem ser observados o aumento da lordose lombar e a deformidade resultante de um deslizamento grave. No deslizamento grave, a inspeção anterior revela uma prega abdominal anterior ao nível do umbigo, como se o abdome tivesse sido jogado para a frente (Fig drop abdominal). Na observação posterior, a nádega tem aparência achatada e em forma de coração.
                                          
A apalpação pode revelar um degrau no nível do deslizamento. O encurtamento dos músculos isquiotibiais é encontrado na maioria dos pacientes sintomáticos. Alterações neurológicas na força, sensibilidade e nos reflexos dos membros inferiores decorrentes de uma radiculopatia são raras nas crianças ou adolescentes.
 
Adultos
 
Os sintomas nos adultos são freqüentemente diferentes daqueles da criança ou do adolescente. A dor lombar é o sintoma mais comum e pode ser devida aos tipos congênito, ístmico ou degenerativo. Nos dois primeiros tipos, há uma história de dor iniciada na adolescência ou no início da terceira década de vida. Se uma dor se inicia após os 40 anos em paciente com espondilólise ou espondilolistese ístmica, outras causas de dor devem ser investigadas. No adulto, não é rara a dor tipo radicular com presença de alterações na sensibilidade, força e no reflexo ao exame neurológico.
A espondilolistese degenerativa pode ser apenas um achado radiológico sem nenhuma expressão clínica. O sintoma mais comum é a lombalgia crônica, mecânica e intermitente. Pode aparecer no início do movimento após um período de repouso e ser aliviada logo em seguida. Dores radicular e não-radicular irradiadas para os membros inferiores podem estar presentes. Manifestações da estenose do canal central, como a claudicação neurogênica, ou da estenose foraminal também podem estar relacionadas à espondilolistese degenerativa.
 
 
EXAMES COMPLEMENTARES
 
Exame radiológico
 
O exame radiológico é o exame mais importante e útil para o diagnóstico, prognóstico e acompanhamento das espondilolisteses. Recomenda-se que ele seja realizado em ortostase nas incidências ântero-posterior, lateral e oblíquas.
O diagnóstico da espondilólise é baseado principalmente na presença do defeito na pars interarticular. Esse defeito é caracterizado por uma linha radiotransparente na pars interarticular, que pode ser vista na incidência lateral, mas é mais bem visualizada nas incidências oblíquas. Na incidência oblíqua, a imagem típica é conhecida como coleira do cão de Lachapelle. O cão de Lachapelle é uma figura assemelhada formada pelas estruturas de uma vértebra. O processo articular superior forma a orelha; o pedículo forma o olho; o processo transverso, a cabeça; o ístmo, o pescoço; o processo espinhoso e a lâmina, o corpo; o processo articular inferior, a pata anterior; e o processo articular inferior oposto, a pata posterior. Entre os processos articulares superior e inferior encontra-se a pars interarticular que forma o pescoço do cão. Uma imagem mais escura no pescoço do cão assemelha-se à coleira que é a imagem da espondilólise (Fig Cachorro de Lachapelle). A imagem semelhante à de um cão decapitado pode ser visualizada na presença da espondilolistese, e a de um cão com o pescoço alongado, na espondilolistese II B.
 
A incidência lateral permite determinar a presença da espondilolistese bem como sua magnitude e seu ângulo de escorregamento. Uma linha traçada sobre o bordo anterior da primeira vértebra sacral não toca o corpo vertebral da quinta lombar. Quando isso ocorre, é sinal de deslizamento, conhecido como sinal de Ullmann.
A magnitude do deslizamento pode ser classificada de acordo com o percentual de desvio da vértebra superior em relação ao comprimento do platô superior da vértebra inferior em quatro graus, segundo Meyerding. A superfície superior da vértebra subjacente é dividida em quatro partes iguais. No Grau I, o deslizamento é de 25% ou menos, isto é, o bordo póstero-inferior da vértebra deslizada anteriormente encontra-se dentro do primeiro segmento; no Grau II, entre 25% e 50%; no Grau III, entre 50% e 75%; e no Grau IV, superior a 75%. O escorregamento total, acima de 100%, é chamado de espondiloptose.
 
Acima de 50% de deslizamento (Grau III, IV e espondiloptose), ocorre também a rotação da quinta vértebra lombar sobre o sacro. Essa rotação pode ser medida pelo ângulo de deslizamento ou ângulo de cifose lombossacra (Fig Ângulo de deslizamento). Esse ângulo é formado pela projeção das linhas prolongadas a partir das superfícies superior do corpo vertebral de L5 e inferior de S1. Como freqüentemente a superfície inferior do platô superior do sacro é mal definida ou obscurecida, a perpendicular de uma linha traçada sobre a superfície posterior do sacro pode ser utilizada em substituição a esta. Quando não há rotação, essas linhas não se encontram anteriormente.
Na incidência lateral podem ser observados também sinais de estabilidade ou instabilidade. São considerados sinais de estabilidade a redução do espaço discal L5-S1, a presença de osteófitos, especialmente os anteriores, e a ausência de mobilidade no exame dinâmico. O exame radiológico dinâmico pode ser realizado em decúbito lateral, com incidências tomadas na flexão e extensão máximas, ou em decúbito lateral e, a seguir, na posição ortostática. São considerados sinais de instabilidade a forma trapezoidal de L5, arredondamento da superfície superior do sacro e a presença de mobilidade no exame dinâmico. A forma trapezoidal e o arredondamento da superfície superior do sacro, entretanto, são considerados mais como conseqüências do deslizamento do que como a causa. Com relação à forma trapezoidal, Vallois e Lozarthes descreveram o índice lombar, que é calculado pela divisão da altura do bordo posterior pela altura do bordo anterior. Em colunas normais a média desse índice foi de 0.89; na espondilólise , 0.83 e na espondilolistese, 0.76.
Na incidência ântero-posterior podem ser notados o defeito na pars interarticular da espondilólise. Nas espondilolisteses graves, a quinta vértebra lombar sobrepõe-se sobre o sacro, formando uma imagem que se assemelha a um chapéu invertido, conhecida como sinal do chapéu de Napoleão invertido.
 
Cintilografia
 
A cintilografia tem indicação principal para o diagnóstico precoce da espondilólise e na diferenciação entre o defeito agudo e o crônico. A hipercaptação do radiofármaco (tecnécio 99) na pars interarticular antecede o aparecimento do defeito ao exame radiológico. O tratamento precoce nessa fase com restrição das atividades físicas pode evitar o agravamento da lesão. A hipercaptação presente na pars na vigência do defeito radiológico estabelecido denota uma lesão aguda que responde favoravelmente à imobilização com gesso ou órteses. É um exame muito útil na definição de tratamento de atletas envolvidos em atividades competitivas. O exame não tem indicação para pacientes assintomáticos ou para aqueles que têm sintomas há mais de um ano.
 
Tomografia computadorizada
 
Raramente é indicada para o diagnóstico de espondilólise ou espondilolistese. É um exame útil na avaliação pré-operatória de pacientes que têm sintomas neurológicos. Esse exame pode mostrar diretamente a massa pseudoartrósica da pars interarticular e sua relação com a raiz nervosa.
 
Ressonância magnética
 
Também é um exame raramente utilizado para o diagnóstico da espondilólise ou da espondilolistese. É útil na avaliação pré-operatória das estruturas moles, como disco, nervos e massa pseudoartrósica.
 
 TRATAMENTO
 
Crianças e adolescentes
 
Espondilólise. Em pacientes com dor de início agudo e com um episódio traumático claramente documentado, a imobilização com gesso ou com órtese pode permitir a consolidação do defeito com restituição da integridade anatômica. Mas, habitualmente, os pacientes diagnosticados com espondilólise apresentam-se com queixas brandas de dor lomba intermitente, de longa duração e sem um evento traumático agudo claramente identificado. Restrição das atividades vigorosas e exercícios de fortalecimento da musculatura do dorso e do abdome são eficientes na maioria dos casos.
Crianças ou adolescentes sintomáticos com espondilólise devem ser acompanhados, devido à possibilidade de desenvolvimento da espondilolistese, especialmente aqueles com menos de 10 anos de idade. Na espondilólise assintomática não há restrição quanto à prática de atividades desportivas.
O tratamento cirúrgico raramente é indicado na espondilólise e é reservado somente para pacientes com sintomas importantes que não respondem ao tratamento conservador e que estão desejosos em manter uma prática desportiva. As técnicas utilizadas incluem a fusão in situ, a fusão instrumentada e o reparo do defeito.
 
Deve ser enfatizado, entretanto, que a espondilólise raramente é sintomática nas crianças e adolescentes. Outras causas para a dor devem ser afastadas antes de se considerar a espondilólise como a causa do sintoma. O diagnóstico diferencial inclui espondilodiscite, osteoma osteóide, hérnia discal, doença de Scheuermann, tumor medular, espondilite reumatóide e desordens neuromusculares. A suspeita de outra causa do sintoma que não a espondilólise deve ser levantada, particularmente, se a dor não é aliviada com o repouso ou com a imobilização ou se há sinais objetivos de alterações neurológicas.
 
Espondilolistese. As espondilolisteses de Grau I ou II assintomáticas devem ser apenas acompanhadas com exame radiológico semestral, devido à possibilidade de agravamento do deslizamento, especialmente em crianças com menos de 10 anos de idade. As práticas desportivas são liberadas, mas a preferência deve ser para aquelas de baixo impacto ou sem solicitação da coluna lombossacra. Para as crianças ou adolescentes sintomáticos, as atividades físicas devem ser interrompidas e um período de repouso relativo, analgésicos e fisioterapia são, em geral, suficientes para alívio dos sintomas. O acompanhamento radiológico é necessário. O retorno às atividades esportivas é liberado apenas se ocorre um grande período livre de sintomas. O tratamento cirúrgico é indicado para pacientes com progressão do desvio documentada ou com sintomas importantes que não cedem com o tratamento conservador. As técnicas cirúrgicas utilizadas incluem a artrodese in situ, a artrodese instrumentada póstero-lateral e a artrodese 360o (circunferencial) com ou sem descompressão. A redução do deslizamento pode ser realizada, mas não é necessária nesse grupo.
 
As espondilolisteses de graus III, IV e espondiloptose na criança e no adolescente são tratadas cirurgicamente, mesmo no paciente assintomático. As técnicas utilizadas para o tratamento são a fusão (artrodese) in situ, fusão in situ com instrumentação e redução com artrodese (Fig Espondiloptose, Fig Redução da Espondiloptose). A descompressão pode ser realizada em associação com uma das técnicas anteriores.
 
Apesar de diversos autores terem demostrado bons resultados realizando apenas a fusão in situ sem descompressão, redução e instrumentação, mesmo em pacientes com sinais de radiculopatia, a técnica apresenta desvantagens, como: necessidade de uso de imobilização gessada prolongada no pós-operatório, maior risco de desenvolvimento de pseudoartrose, não-correção da deformidade estética e possibilidade de deslizamento, mesmo na vigência de fusão sólida comprovada. A síndrome da cauda eqüina também tem sido associada a essa técnica.
A associação da instrumentação dispensa o uso de imobilização gessada no pós-operatório, diminui a taxa de pseudoartrose e auxilia na redução quando indicada. A lesão radicular é a principal desvantagem, especialmente em centros pouco familiarizados com a técnica. A redução permite a correção da deformidade estética, aumenta a taxa de fusão e reduz a possibilidade de recidiva do deslizamento no pós-operatório.
A correção do ângulo de deslizamento parece ser mais importante no efeito estético, nas taxas de fusão e na prevenção da recidiva do que a redução do grau de deslizamento. Entretanto, a técnica está associada com maior possibilidade de lesão neurológica no pós-operatório.
A indicação da descompressão é controversa no tratamento das espondilolisteses. Muitos autores defendem a realização da descompressão na presença de qualquer déficit sensitivo, motor ou de reflexos, de espasmos de isquiotibiais ou anormalidade da marcha. Outros acreditam que a descompressão raramente é indicada e que a melhora neurológica é resultado da estabilização proporcionada por uma fusão sólida. As indicações para descompressão radicular são as disfunções esfincterianas, o déficit motor que interfere com a marcha normal e dor radicular grave. Quando há dor radicular ou déficit neurológico, Gill e colaboradores defendem que a lâmina de L5 e a massa fibrocartilaginosa da pars sejam removidas de modo a descomprimir as raízes nervosas. Na espondilolistese congênita com arco íntegro, a lâmina de L5 desvia anteriormente e comprime as raízes da cauda contra o corpo vertebral de S1. Nessa situação, há um espasmo intenso dos isquiotibiais, e a ocorrência da síndrome da cauda eqüina não é infreqüente. Esses casos são melhor tratados com descompressão, redução e fixação. Sempre que a descompressão é realizada, a fixação deve ser considerada, já que o procedimento isolado apresenta complicações, como dor lombar, pseudoartrose e progressão do deslizamento.
 
Adultos
 
O tratamento nos adultos difere do da criança e do adolescente, sendo a dor o principal critério na indicação do tratamento. Pacientes com sintomas leves ou moderados são tratados conservadoramente, com repouso relativo, analgésicos e fisioterapia. Os exercícios dentro da água e o fortalecimento dos músculos do dorso e do abdome são benéficos na maioria dos pacientes, mas exercícios em extensão devem ser evitados. Pacientes com sintomas incapacitantes ou que não respondem às medidas conservadoras podem ser tratados cirurgicamente. A fusão in situ é pouco indicada nesse grupo pela alta freqüência de pseudoartrose. Na espondilólise, o reparo do defeito pode ser realizado se a falha não é maior que sete milímetros, não há sinais de artrose e em lesões em mais de um nível. A artrodese póstero-lateral e a circunferencial (PLIF) com ou sem descompressão são atualmente mais utilizadas.
 
O tratamento da espondilolistese degenerativa é feito, inicialmente, com repouso no leito (dois a cinco dias) e com medicação antiinflamatória. Se os sintomas persistem, a fisioterapia analgésica pode ser utilizada (ultra-som, estimulação elétrica transcutânea etc). Uma órtese lombar rígida por quatro a seis semanas também pode auxiliar no controle dos sintomas. Passada a fase álgica aguda, um programa de exercício é recomendado, com atividades aeróbicas como bicicleta ergométrica ou natação. As indicações para o tratamento cirúrgico são: dor no membro inferior (ciatalgia) persistente ou recorrente, apesar do tratamento conservador realizado adequadamente, déficit neurológico progressivo, redução significativa da qualidade de vida pela dor ou limitação funcional. Os achados de estudos de imagem devem ser sempre compatíveis com os achados clínicos na eventualidade do tratamento cirúrgico. A dor da espondilolistese degenerativa, em geral, origina-se da compressão neurológica e do movimento sobre as articulações artrósicas. O princípio do tratamento cirúrgico é baseado na descompressão neurológica e na estabilização vertebral. A descompressão pode ser conseguida diretamente, pela remoção parcial óssea ou de partes moles em volta da estrutura neurológica comprimida, ou indiretamente, pela redução do deslizamento e pela recuperação da altura do espaço discal. A estabilização definitiva da coluna é atingida com a fusão. A utilização de implantes pediculares confere estabilização imediata e atualmente é largamente empregada nesse tipo de cirurgia.
 
Espondilólise e Espondilolistese
Por Dr. Jefferson Soares Leal
19/10/2007
Atualizado 27/01/2009
 
 
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