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Hérnia do disco cervical


Doença degenerativa do disco cervical

INTRODUÇÃO

A degeneração do disco intervertebral cervical é parte do processo de degeneração que afeta todos os componentes da unidade funcional vertebral cervical. Acredita-se que a degeneração da coluna vertebral cervical se inicia no disco (vídeo about degen. O disco intervertebral, com seu núcleo pulposo e ânulo fibroso, funciona como um amortecedor, recebendo e distribuindo as pressões que neles são submetidas. Com o processo normal do envelhecimento, ocorrem modificações bioquímicas do núcleo pulposo, com perda da sua capacidade de distribuir adequadamente as cargas que se concentram sobre partes do ânulo fibroso, levando à formação de fissuras que freqüentemente permitem o extravasamento de parte do núcleo pulposo. Como conseqüência desse processo, há perda da altura do espaço discal intervertebral, ocasionando sobrecarga das articulações facetárias. A sobrecarga leva ao desgaste da cartilagem facetária, resultando em hipermobilidade intervertebral com afrouxamentos e hipertrofias dos ligamentos e cápsulas, com estímulo à formação de osteófitos. Alguns pacientes poderão apresentar sintomas em uma ou mais fases desse processo. Essas alterações podem se manifestar basicamente como três síndromes clínicas: cervicalgia, radiculopatia ou mielopatia. Na etapa inicial, pode haver a dor discogênica (cervicalgia); na extrusão do conteúdo discal, podem ocorrer sintomas resultantes da compressão aguda da raiz nervosa (radiculopatia) ou da medula cervical (mielopatia); e na fase tardia, a dor pode ser decorrente tanto da mobilidade sobre o segmento artrósico (cervicalgia) quanto da compressão radicular (radiculopatia) ou medular crônica (mielopatia) exercida pelos osteófitos, hipertrofias ou dobras ligamentares sobre as estruturas neurais. No conjunto, todas essas alterações podem ser enquadradas dentro das doenças degenerativas cervicais. As manifestações clínicas e a correlação com os exames de imagens são fundamentais para a identificação da provável causa dos sintomas apresentados pelo paciente.

HISTÓRIA NATURAL

A importância do conhecimento da história natural de uma doença é óbvia: os resultados dos procedimentos cirúrgico ou conservador devem ser comparados com a história natural da patologia antes da definição e recomendação de um tratamento.
A cervicalgia isolada tem evolução favorável na maioria dos casos. Lawrence encontrou 9% de prevalência total. Dor limitada à região dos ombros é mais freqüente em homens, enquanto a localização cervical alta é mais freqüente em mulheres. Os episódios de cervicalgia, em sua maioria, tendem a ser autolimitados e de curta duração, com boa resposta ao tratamento conservador. Gore e colaboradores acompanharam, por 10 anos, 205 pacientes com cervicalgia, tratados conservadoramente, e concluíram que 79% melhoram ou permanecem assintomáticos; 13% permanecem com sintomas inalterados; e 8% pioram. Rothmann e Rashbaum observaram que com cinco anos de acompanhamento somente 25% dos pacientes apresentam sintomas importantes. Até o momento, a taxa de sucesso clínico no alívio da cervicalgia com a fusão cirúrgica cervical é a mesma observada com a evolução natural. Portanto, a intervenção cirúrgica para a cervicalgia isolada é desencorajada até que estudos controlados provem o contrário.
A história natural da radiculopatia cervical foi estudada por Lees e Turner em 1963. Esses autores acompanharam, por 19 anos, 51 pacientes que tiveram inicialmente sintomas de radiculopatia cervical e concluíram que 45% dos pacientes experimentam alívio completo dos sintomas e sem recidivas; 30% têm sintomas brandos; e 25% apresentam sintomas persistentes ou pioram. Nenhum dos pacientes estudados apresentou evolução para mielopatia. Os autores ainda concluíram que o uso do colar cervical freqüentemente alivia os sintomas, mas que qualquer tratamento ou nenhum apresenta resultado final similar.
Lees e Turner estudaram, também, 44 pacientes que apresentavam sintomas de mielopatia cervical. Pacientes inicialmente com sintomas brandos apresentam melhor prognóstico. Entretanto, dos 15 pacientes que apresentavam, a princípio, incapacidade grave, 14 permaneceram com incapacidade grave ou moderada. Os autores concluíram que o curso da mielopatia cervical espondilótica é geralmente de longa duração e não progressiva, com raros exemplos de deterioração progressiva. Nurick também estudou a história natural da mielopatia cervical e encontrou resultados semelhantes. O autor descreve o resultado do tratamento conservador realizado em 36 pacientes acompanhados por 20 anos. Dos 27 pacientes classificados no início como tendo sintomas brandos, 18 permaneceram com sintomas brandos; seis dos nove que tiveram sintomas moderados a graves permaneceram inalterados ao final do seguimento. O fator de risco mais associado com a deterioração foi a idade acima de 60 anos no momento da apresentação.

QUADRO CLÍNICO

Paciente com doença discal degenerativa pode apresentar cervicalgia, radiculopatia, mielopatia ou associações destas.

Cervicalgia
(Dor no pescoço)

 A cervicalgia é a dor na região posterior do pescoço. A dor cervical isolada sem dor radicular ou déficit neurológico é um sintoma muito comum e inespecífico que pode se originar de outras estruturas que não a coluna cervical, como a junção crânio-cervical, o ouvido, o ombro, as vísceras e o aparelho cardiorrespiratório. A dor originada da coluna cervical pode ser resultado de vários processos mecânicos, como degeneração discal, lesão ligamentar e artrose facetária, assim como processos não mecânicos, como infecção e tumor. Pacientes com doença discal degenerativa podem apresentar rigidez, espasmo muscular, cefaléia e dor com irradiação para escápula, ombro, tórax e mesmo para a face.
Determinar a origem da dor cervical é muitas vezes difícil. A tentativa de correlacionar a localização da dor com o seu sítio de origem tem sido feita com a utilização de testes provocativos das articulações facetárias e da discografia. O estímulo álgico das articulações facetárias resulta em dor de localização mais ou menos específica da região cervical (Fig origem dor CERVICAL).

Alternativamente, a partir da área em que o paciente refere a dor, pode-se especular sobre a provável origem na coluna cervical. Se a discografia provocativa reproduz a dor de que o paciente normalmente se queixa, a origem provável será o disco estimulado.
A dor cervical associada com cefaléia pode ter origem nas articulações atlantooccipital ou atlantoaxial. A cefaléia pode estar associada com a instabilidade atlantoaxial, particularmente em pacientes com artrite reumatóide. Pacientes idosos com cefaléia e limitação dos movimentos das articulações atlantooccipitais freqüentemente apresentam artrose dessas articulações, demonstrada através de radiografia transoral em ântero-posterior, tomografia ou ressonância magnética. Cervicoartrose C2-C3 pode produzir cefaléia posterior unilateral e dor facial atípica.
Pacientes com degeneração discal cervical baixa crônica referem piora intermitente da dor e rigidez mais acentuada pela manhã ou ao acordar no meio da noite. Sintomas incomuns como vertigem, zumbido, embaçamento intermitente da visão, dor retroocular, dor facial e dor maxilar podem estar relacionados ao envolvimento da cadeia simpática na região cervical.
No exame físico, é mais importante o examinador observar as respostas aos movimentos que meramente registrar o movimento limitado. Os movimentos de maior desconforto são importantes na diferenciação da dor discogênica da dor de outras origens. Geralmente, a extensão e a rotação lateral para o lado do sintoma agravam a dor discogênica e a dor originada nas articulações facetárias. Pacientes com fibromialgia ou com instabilidade ligamentar têm a dor agravada com a flexão.

Radiculopatia

O termo radiculopatia se refere aos sinais e sintomas resultantes da disfunção de uma raiz nervosa. A disfunção pode ser causada por uma compressão mecânica do nervo provocada por uma hérnia discal ou um osteófito. A compressão radicular pode produzir alterações clássicas no reflexo, nas funções motora e sensitiva da raiz comprometida. Porém, devido à alta sobreposição funcional das raízes nervosas cervicais, os achados clássicos descritos na literatura não são freqüentemente vistos (Tabela).

Tabela  - Dermátomos, miótomos e reflexos das raízes cervicais
Raiz Dermátomo Miótomo Reflexo

 

 

Raiz

Dermátomo

Miótomo

Reflexo

 

C1

 

 

C2

 

 

 

 

C3

 

 

 

 

C4

 

C5

 

 

C6

 

 

 

C7

 

 

 

C8

 

 

 

T1

 

Abóbada do crânio

 

 

Área occipital e anterior do pescoço

 

 

 

Área posterior do pescoço e supraclavicular

 

 

 

Área do ombro e supraescapular

 

Face lateral do braço

 

 

Face lateral do antebraço, polegar e indicador

 

 

Terceiro quirodáctilo

 

 

 

Face medial do antebraço, dedo anular e mínimo da mão

 

 

Face medial do braço

 

Não há

 

 

Esternocleidomastóideo, longo do pescoço, reto da cabeça

 

 

 

Trapézio, esplênio da cabeça

 

 

 

 

Trapézio e elevado da escápula

 

Deltóide e bíceps

 

 

Músculos extensor radial longo e curto do carpo e bíceps

 

 

Tríceps, músculos flexores do punho e extensores dos dedos

 

 

Músculos interósseos e flexores digitais

 

 

 

Músculos interósseos

 

Não há

 

 

Não há

 

 

 

Não há

 

 

 

Não há

 

Bíceps

 

 

Braquirradial

(Bíceps)

 

 

Tríceps

 

 

 

Não há

 

 

 

Não há

[

 

As raízes cervicais, da primeira à sétima, deixam a coluna cervical acima da vértebra correspondente, enquanto a oitava raiz cervical sai entre a sétima e a primeira vértebras torácicas. A primeira raiz cervical (C1) emerge entre o occipito e a primeira vértebra cervical, e a segunda raiz cervical (C2) entre a primeira e a segunda vértebras cervicais (nível C1-C2). Classicamente, uma lesão no nível C2-C3 causa compressão da terceira raiz cervical (C3). A radiculopatia de C3 produz dor cervical posterior, com irradiação para a região occipital e a orelha, e mais raramente para a região supraclavicular. A função motora é pouco comprometida e não há reflexo específico. Essa raiz é raramente envolvida nos processos degenerativos da coluna cervical devido ao limitado grau de movimento do nível C2-C3. A radiculopatia de C4 é acompanhada de dor cervical posterior, com irradiação freqüente para a região supraescapular, o ombro e a região anterior do tórax. Em geral, a dor é agravada pela extensão cervical. A quarta raiz cervical possui fibras que participam da inervação do músculo diafragma, mas a compressão de C4 raramente altera a função diafragmática. Também não apresenta alteração motora ou de reflexos específicos.
As disfunções das raízes cervicais inferiores (C5, C6, C7 e C8) são mais comuns devido à maior mobilidade nesses níveis. A raiz de C7 é a mais comprometida, seguida de C6, C8 e C5. A localização da área da dor na região cervical e no braço, a presença de parestesias nos dedos e a alteração dos reflexos nos membros superiores auxiliam na caracterização clínica da raiz comprometida (Tabela).

Tabela - Caracterização Clínica da Radiculopatia Cervical

 

C5

C6

C7

C8

Dor cervical

 

Dor no braço

 

 

Parestesias em dedos

 

Fraqueza muscular

 

Reflexo diminuído

Supraescapular

 

Área superior lateral do braço

 

Não tem

 

 

Deltóide (bíceps)

 

 

Bíceps

 

Supraescapular

 

Lateral do braço

 

 

Polegar

 

 

Bíceps (deltóide)

 

 

Braquirradial

(Bíceps)

Escapular/interescapular

 

Posterior do braço

 

 

Dedo médio

 

 

Tríceps

 

 

Tríceps

Escapular/interescapular

 

Medial

 

 

Dedo mínimo

 

 

Intrínsecos

 

 

Não há


Uma hérnia de disco em C4-C5 é incomum, mas é mais freqüente que nos níveis cervicais superiores. É o terceiro local mais freqüente, após os níveis C5-C6 e C6-C7. A radiculopatia de C5 resultante de uma lesão em C4-C5 produz dor cervical de localização supraescapular e nas regiões superior e lateral do braço. Pode haver diminuição da força muscular do deltóide e do bíceps, assim como diminuição ou ausência do reflexo bicipital.
Os discos dos níveis C5-C6 e C6-C7 são os mais afetados pela doença discal degenerativa. A radiculopatia de C6 (nível C5-C6) produz dor cervical de localização supraescapular e dor no braço de localização lateral. Pode haver diminuição da força do bíceps, diminuição ou ausência do reflexo braquirradial e parestesias na área do polegar. A radiculopatia de C7 é a mais comum devido tanto à hérnia discal, quanto a alterações degenerativas no nível C6-C7. A marca mais característica da disfunção dessa raiz é a parestesia do dedo médio. A diminuição ou ausência do reflexo tricipital é um achado confiável nessa disfunção. A dor cervical irradia-se geralmente para a região interescapular e pode haver dor no braço de localização posterior.
A hérnia de disco no nível C7-T1 é incomum, mas pode ocorrer. A neuropatia de C8 produz dor cervical com irradiação para a área interescapular, dor na região medial do braço, fraqueza dos músculos intrínsicos da mão e parestesia do dedo mínimo.

Durante o exame físico é importante observar a atitude do paciente. É comum em episódios agudos da cervicobraquialgia por hérnia de disco o paciente assumir uma atitude com o membro superior apoiado sobre a cabeça. A abdução do ombro alivia os sintomas decorrentes da compressão radicular nos níveis C4-C5 e C5-C6. Essa posição antálgica é conhecida como sinal de Bakody.
Na avaliação da amplitude dos movimentos, é importante registrar qual movimento agrava o sintoma. A extensão e a inclinação lateral estreitam o forame intervertebral e agravam a dor radicular, enquanto a flexão o alarga, podendo aliviar os sintomas decorrentes de uma radiculopatia.
O sinal de Spurling é considerado patognomônico de radiculopatia. É caracterizado pela reprodução da dor no membro superior, no ombro ou na cintura escapular que aparece com a compressão axial e inclinação lateral da cabeça para o lado do sintoma. O sinal pode ser potencializado pela extensão da cabeça (Fig Teste de Spurling). Essa manobra reduz o tamanho do forame intervertebral, resultando em “pinçamento” da raiz comprometida.

Mielopatia cervical

A compressão da medula espinhal cervical pode resultar em disfunção da medula com sinais e sintomas característicos de uma condição conhecida como mielopatia cervical. Essa condição pode ser precipitada por uma hérnia discal central volumosa ou, mais freqüentemente, por alterações degenerativas graves. Um trauma leve pode desencadear os sintomas. Entretanto, a maioria dos pacientes não consegue precisar o tempo do início dos sintomas. Os sintomas variam largamente, mas incluem deterioração da marcha e da destreza manual, fraqueza generalizada e urgência ou aumento da freqüência urinária.

Muitas doenças além das cervicais degenerativas podem evoluir com dor cervical, radiculopatia e mielopatia, ou combinações destas (Tabela). É de fundamental importância a exclusão dessas doenças, já que um tratamento baseado em um diagnóstico incorreto resulta, muitas vezes, em conseqüências desastrosas.

Tabela - Diagnóstico diferencial da doença discal cervical

 

NEUROLÓGICA

  Esclerose múltipla

  Esclerose lateral amiotrófica

  Doença cerebrovascular

  Doença de Guillain-Barré

  Siringomielia

  Neuropatias compressivas periféricas

  Neurite ou lesão do plexo braquial

  Síndrome do desfiladeiro

 

INFLAMATÓRIA

  Artrite reumatóide

  Espondilite anquilosante

  Gota e pseudogota

  Fibromialgia

  Polimialgia reumática

 

NEOPLÁSICA

  Metástase

  Tumor ósseo primário

  Tumor intradural

  Tumor extravertebral (tumor de Pancoast, intracerebral, da cintura escapular)

 

INFECCIOSA

  Osteomielite ou discite da coluna vertebral

 

PATOLOGIAS DOS MEMBROS SUPERIORES 

  Tendinite ou bursite subacromial

  Síndrome do manquito rotador

  Instabilidades do ombro

  Artrose glenoumeral

  Capsulite adesiva

  Epicondilite do cotovelo

  Distrofia simpática reflexa

 

DOENÇAS VISCERAIS E OUTRAS

  Isquemia cardíaca

  Doença gastrointestinal

  Compressão da artéria vertebral

  Doença temporomandibular

  Doença da tireóide

 


Doenças neurológicas, como a esclerose lateral amiotrófica e a esclerose múltipla, devem ser excluídas quando a espondilose cervical não é claramente a causa da mielopatia. A esclerose lateral amiotrófica apresenta-se como uma fraqueza indolor simétrica dos ombros, em geral entre a quarta e a sexta décadas de vida. Não há alteração sensitiva, mas atrofia e fasciculações aparecem precocemente no curso da doença. A esclerose múltipla apresenta-se classicamente com alterações visuais e lesão do neurônio motor superior, mas pode simular uma radiculopatia de uma hérnia de disco com dor e fraqueza muscular. A idade típica do início é entre 20 e 40 anos. A ressonância magnética evidencia as lesões (placas) características da esclerose múltipla na medula cervical ou no cérebro. O acometimento de múltiplos nervos é comum. O acidente vascular cerebral pode causar paralisia dos músculos da cintura escapular e dor. A doença de Guillain-Barré é uma condição que atinge os nervos periféricos com paralisia ascendente, afetando primeiro os membros inferiores e depois os superiores. É também conhecida como polineurite idiopática aguda. O grau do comprometimento motor é mais acentuado que o sensitivo. As neuropatias compressivas periféricas que podem simular a radiculopatia incluem as síndromes do pronador, do interósseo posterior, do túnel do carpo e do nervo ulnar. São condições neuropáticas resultantes da compressão de um nervo em algum ponto de seu trajeto no membro superior. A neurite do plexo braquial é uma doença muito dolorosa, provavelmente causada por uma infecção viral das fibras motoras. A síndrome começa com uma dor de início súbito de duração aproximada de duas semanas, seguida de fraqueza no membro superior sem nenhuma alteração sensitiva. A síndrome do desfiladeiro envolve a compressão de estruturas neurológicas e/ou vasculares na passagem dessas estruturas do pescoço para a axila. A lesão do plexo braquial pode ocorrer em acidentes automobilísticos ou resultar de lesão cirúrgica inadvertida. A manifestação clínica depende da localização e da gravidade do dano.
A fibromialgia é uma freqüente causa de cervicalgia. Nessa condição, além da dor cervical, é comum dor no trapézio e na cintura escapular, distúrbios do sono e depressão. Os pontos-gatilho são característicos dessa moléstia. Esses pontos são áreas bem definidas e hipersensíveis dentro do tecido muscular que, quando pressionados, produzem nas adjacências dor difusa, profunda e mal localizada.

As doenças neoplásicas podem causar cervicalgia por destruição e instabilidade, por compressão radicular ou medular e por reação inflamatória secundária. Os pacientes queixam-se de dor contínua que se agrava à noite e os acorda ou os impede de dormir. As metástases ósseas em coluna cervical podem ocorrer, mas são menos comuns que nas colunas torácica e lombar. O osteoma osteóide pode causar dor local que é aliviada por antiinflamatórios não-hormonais. O osteoblastoma tem predileção pelas estruturas posteriores da vértebra e raramente causa sintomas neurológicos. O granuloma eosinofílico infiltra o corpo vertebral e pode produzir a vértebra plana com sintomas neurológicos subseqüentes. O tumor de células gigantes e o cisto ósseo aneurismático evoluem com grande massa de tecido tumoral que pode comprimir raízes e medula.
A dor radicular unilateral pode resultar de vários tumores benignos. O Schwannoma geralmente é intradural e se desenvolve na raiz sensitiva, produzindo, caracteristicamente, a dor radicular unilateral. Quando muito grande, como na neurofibromatose, pode causar sintomas mielopáticos. Na incidência radiológica em oblíqua, o forame intervertebral encontra-se alargado, típico dessa lesão. O meningioma geralmente afeta mulheres de meia idade e tem origem e apresentação clínica similar. O tumor intradural deve ser excluído em pacientes com mieloradiculopatia com dor em queimação e que piora à noite.
Tumores extravertebrais podem simular a doença discal cervical pelo desenvolvimento de dor no ombro e no braço. O exemplo clássico é o tumor de Pancoast do ápice do pulmão. Esse tumor pode invadir o plexo braquial e causar dor e fraqueza muscular no membro superior, acompanhada de síndrome de Horner (miose ipsilateral, pseudoptose e enoftalmia), devido à lesão da cadeia simpática.
As doenças infecciosas apresentam, geralmente, queda do estado geral, febre, adinamia e inaptência. A dor não é aliviada pelo repouso e o espasmo muscular paravertebral é significativo. Tanto na espondilodiscite tuberculosa quanto na piogênica, os exames de imagem mostram o centro da lesão localizado no disco vertebral.
Doenças ortopédicas, tais como tendinite do supraespinhoso, epicondilite lateral do cotovelo e artrose glenoumeral, podem ser confundidas com a radiculopatia. A dor desencadeada pela mobilização do ombro ou pela palpação da área do epicôndilo do cotovelo auxilia no diagnóstico. No exame neurológico, não são observadas alterações na força, nos reflexos ou sensibilidade dos membros superiores.
Doenças cardíacas, gastrintestinais e da articulação temporomandibular podem ser acompanhadas de dor referida para a região cervical. Doenças da tireóide freqüentemente causam dor cervical anterior.

EXAMES COMPLEMENTARES

Exame radiológico

A técnica radiológica padrão para avaliação da doença discal degenerativa inclui a obtenção das incidências lateral, ântero-posterior (AP) e oblíquas. A incidência lateral é útil na avaliação dos espaços discais, da presença de osteófitos, do alinhamento cervical e das articulações facetárias. Na incidência em AP, são visualizados os espaços discais, os processos unciformes e as articulações uncovertebrais. As incidências oblíquas direita e esquerda permitem avaliar os forames intervertebrais, pedículos, maciços articulares e articulações facetárias.
As alterações degenerativas da coluna cervical (espondilose cervical) incluem redução do espaço discal, osteofitose e osteoartrose facetária e uncovertebral. O estreitamento do espaço discal é o achado mais comum da espondilose cervical e pode levar à diminuição da lordose fisiológica. Os osteófitos anteriores são maiores que os posteriores, mas são geralmente assintomáticos. Osteófitos anteriores grandes e em múltiplos níveis podem ser indicativos da hiperostose esquelética idiopática difusa. Osteófitos posteriores podem causar compressão medular. O canal medular em adultos normais mede 17 mm da parede posterior do corpo vertebral até a lâmina da vértebra correspondente. Se esse espaço é reduzido para menos de 13 mm pela presença de um osteófito posterior, pode ocorrer compressão medular. O espaço menor que 10mm está altamente associado a sintomas da compressão medular cervical.
Os achados radiológicos na coluna cervical degenerativa devem ser interpretados com cuidado. Vários autores têm chamado a atenção para o fato de que alterações degenerativas nos espaços discais são muito comuns após a idade de 40 anos e afetam 70% da população com 70 anos. Essas alterações são muito prevalentes em indivíduos assintomáticos e freqüentemente não se correlacionam com sintomas clínicos. Os exames radiológicos não permitem avaliar adequadamente as estruturas neurais.

Tomografia computadorizada

A tomografia computadorizada permite a visualização direta da compressão neural e melhor visualização da patologia lateral, tal como na estenose foraminal. A precisão da tomografia pode ser melhorada após a mielografia (injeção de contraste radiológico no espaço subaracnóide).

Ressonância magnética

A ressonância magnética apresenta excelente resolução para avaliação de estruturas moles da coluna (discos e estruturas neurais). É um exame não-invasivo e não expõe o paciente à radiação ionizante. Como os demais exames complementares, esse exame deve ser interpretado com cuidado devido à alta freqüência de achados sem significado clínico. Boden encontrou 19% de anormalidades significativas em pessoas assintomáticas. Em indivíduos assintomáticos com idade inferior a 40 anos, 14% apresentavam hérnia discal ou estenose foraminal. Acima de 40 anos, esse percentual aumentava para 25%.

Eletroneuromiografia

É um exame útil em complementação à história clínica e ao exame físico para o diagnóstico da radiculopatia ou mielopatia cervical, mas não isoladamente. A eletroneuromiografia (EMG) permite confirmar o diagnóstico de radiculopatia ou mielopatia, auxilia na definição da localização anatômica de uma lesão e na distinção de determinadas condições neurológicas específicas, tais como esclerose múltipla, esclerose lateral amiotrófica e síndromes compressivas periféricas. É um exame altamente sensível, porém pouco específico.

Discografia provocativa

É um exame invasivo que pode ser útil no diagnóstico da dor cervical discogênica. Consiste na injeção de um pequeno volume contraste radiológico em um disco com sinais de degeneração. A resposta à injeção do contraste (dolorosa ou indolor) é mais importante que a imagem desenhada pelo contraste documentada pela radiografia. Como nem todo disco degenerado é causa de dor cervical, trata-se de um exame potencialmente capaz de diferenciar um disco degenerado doloroso de um indolor. A realização da discografia requer um profissional habituado com a técnica. É um procedimento complexo com componentes múltiplos, necessitando-se experiência considerável, pela possibilidade de ocorrência de limitadas, mas dramáticas complicações. A indicação da discografia é limitada à confirmação da dor discogênica em um ou mais níveis, com base na história, no exame clínico e na reprodução da dor do paciente (dor concordante). A discografia nunca deve ser indicada para procurar alguma patologia operável em um paciente sem um quadro clínico claro.
A necessidade de qualquer exame complementar é sempre orientada pelos achados da história clínica e do exame físico. Assim, os exames descritos e outros, como hemograma, velocidade de hemossedimentação, cintilografia, mielografia, estudos radiológicos dinâmicos, pesquisa de ácido úrico, fator reumatóide, são solicitados à luz dos achados clínicos.

TRATAMENTO

Tratamento não-cirúrgico

Há várias opções de tratamento para pacientes que apresentam dor cervical, radiculopatia ou mielopatia cervical. É raro o tratamento cirúrgico ser considerado a princípio, exceto se há um déficit neurológico rapidamente progressivo. A maioria dos pacientes responderá bem aos vários medicamentos disponíveis ou ao tratamento fisioterápico.
As modalidades de tratamento conservador incluem colar cervical, antiinflamatórios, analgésicos e fisioterapia.
O colar cervical deve ser utilizado por curto período de tempo, até os sintomas agudos iniciais cederem. Os antiinflamatórios são eficazes na maioria dos casos, mas não devem ser usados de forma contínua a longo prazo, devido aos efeitos colaterais. A compressão mecânica da raiz nervosa leva a inflação e dor. A diminuição da inflação geralmente reduz a dor do paciente. Analgésicos são importantes na fase aguda, e relaxantes musculares auxiliam na quebra do ciclo vicioso espasmo ↔ dor. As injeções epidurais de corticóide podem ser úteis na presença de radiculopatia. Infiltrações de anestésicos e corticóides em pontos-gatilho musculares na fibromialgia são empíricas, mas podem funcionar em pacientes com cervicalgia crônica.
Dentre as modalidades de fisioterapia, o valor da tração cervical não está totalmente esclarecido. Ela está contra-indicada na presença de compressão medular, artrite reumatóide, infecção e osteoporose. Seu efeito parece estar relacionado ao relaxamento muscular proporcionado. Não há evidência científica, até o momento, de que a tração mecânica é mais efetiva que a manual. Exercícios de fortalecimento isométricos da musculatura paravertebral devem ser iniciados tão logo os sintomas agudos cedam. Crioterapia, ultra-som e eletroestimulação transcutânea (TENS) são adjuvantes importantes da fase aguda. A presença dos pacientes no ambiente de reabilitação pode ter ainda um efeito psicológico benéfico, pela interação com outros pacientes que compartilham do mesmo problema.

Tratamento cirúrgico

A cirurgia raramente é indicado no tratamento da cervicalgia isolada. Mas, a fusão cervical pode ser realizada. A indicação é restrita a pacientes com dor cervical incapacitante de origem discal comprovada em um só nível, na ausência de outras possíveis causas para a dor. A prótese discal recentemente tem sido indicada nessa mesma condição, mas os estudos são ainda incipientes e de pequeno seguimento (Fig Prótese do disco cervical). Ao contrário da cervicalgia isolada, a radiculopatia e a mielopatia podem ter resultados favoráveis e mais previsíveis com o tratamento cirúrgico.

Radiculopatia. As indicações do tratamento cirúrgico da radiculopatia compressiva incluem déficit neurológico progressivo, déficit neurológico estático com dor intratável, braquialgia persistente ou recidivante e estudos de imagens comprobatórios da compressão e consistentes com os achados clínicos. Recomenda-se pelo menos três meses de tratamento conservador, exceto se o paciente apresenta déficit neurológico progressivo ou dor intensa e incapacitante após tratamento conservador. A remoção do agente compressivo poderá ser realizada pela via anterior ou posterior.
A via anterior é mais utilizada quando a compressão é anterior e limitada até três níveis. Por esta via, o disco ou o osteófito pode ser ressecado e o nível artrodesado. Ela apresenta a desvantagem de não permitir a visualização adequada da raiz.
A via posterior é a escolhida quando o processo patológico se localiza posteriormente, ou quando mais de três níveis necessitam de descompressão. Essa via permite descompressão posterior e boa exposição da região lateral do canal vertebral, mas é contra-indicada se há inversão da lordose, pois a compressão anterior persiste mesmo após a laminectomia. Tem a vantagem de permitir a ressecção de hérnia do disco ou osteófito, ao mesmo tempo em que se tem boa visualização da raiz. Uma complicação possível quando se realiza laminectomia extensa por essa via é a instabilidade crônica e a inversão da lordose cervical.

Mielopatia. O tratamento conservador para a mielopatia consiste em medidas para controlar a dor cervical, quando presente, e para a manutenção da amplitude dos movimentos da coluna cervical. Analgésicos, antiinflamatórios, miorrelaxantes e fisioterapia são utilizados com esse propósito. Entretanto, a mielopatia é uma condição essencialmente de tratamento cirúrgico, e os resultados são favorecidos pela precocidade do tratamento descompressivo. Pacientes com incapacidade moderada ou grave na ocasião da apresentação inicial podem se beneficiar significativamente da descompressão cirúrgica.
Os fatores de bom prognóstico para o tratamento cirúrgico incluem a idade pouco avançada, duração dos sintomas menor que um ano, envolvimento de poucos níveis, déficit motor unilateral e presença do sinal de Lhermitte.
A descompressão cirúrgica pode ser feita pelas vias anterior ou posterior. A via anterior é recomendada quando a patologia compressiva é anterior (osteófito, espondilose, hérnia de disco etc), ou na presença de cifose cervical. A via posterior deve ser considerada na presença de estenose cervical em três níveis ou mais, estenose congênita associada, ossificação do ligamento longitudinal posterior, falha prévia de cirurgia pela via anterior e compressão posterior por ligamento amarelo hipertrofiado ou por artropatia facetária. A laminoplastia de porta aberta ou a laminectomia associada à artrodese instrumentada concomitante são alternativas cirúrgicas para evitar a cifose por instabilidade após cirurgia descompressiva posterior.


DOENÇA DEGENERATIVA DO DISCO CERVICAL
HÉRNIA DO DISCO CERVICAL
Por Dr. Jefferson Soares Leal
05/10/2007
30/01/2009

Referências Bibliográficas

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